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Uma rede intertropical de redes

An Intertropical Web of Networks

Investigações de Diana Pizano, Sebastián Lema e Nada Tshibwabwa. Cortesia de Futura Trōpica. Daniela Medina Poch

18 July 2021

Magazine América Latina Magazine

Words Daniela Medina Poch

5 min de leitura

O projeto Futura Trōpica reescreve nossa compreensão dos trópicos como região e como mentalidade.

Daniela Medina Poch: O que é Futura Trōpica?

Juan Pablo García Sossa: A Futura Trōpica é uma rede intertropical e descentralizada composta por redes locais, que conecta comunidades e territórios no cinturão tropical do planeta, a fim de trocar conhecimentos, tecnologias e projetos endêmicos. Por um lado, é um projeto de pesquisa que pretende fortalecer e canalizar conversas entre comunidades no cinturão tropical, para redefinir nossa compreensão dos trópicos. Por outro lado, é uma interseção de redes: redes locais e de afeto, e redes a partir de uma perspectiva técnica e infraestrutural, o que inclui internet, intranet, wi-fi, etc. Os nós atuais são Bogotá, Kinshasa e Bengaluru, onde há 30 colaboradores ativos de diferentes perfis e práticas de vida.

DMP: Como os trópicos foram excluídos das narrativas globais, e que estratégias a Futura Trōpica propõe para reclamá-los?

JPGS: Os trópicos são regiões historicamente desvalorizadas e exotizadas. Têm sido considerados apenas para a exploração de recursos, ou como campos de experimentação não monitorada (como no caso da Cambridge Analytics, no Quênia). O sistema de globalização e progresso que estigmatiza os trópicos como uma região “subdesenvolvida” gerou na região uma ânsia de “alcançar” o mundo “desenvolvido” através da importação de ideias externas de progresso, e impedindo-nos de analisar nossas próprias noções de desenvolvimento. Os trópicos raramente têm sido reconhecidos como um lugar de onde emerge conhecimento. Por exemplo, partindo da ideia da “lacuna tecnológica”, acredita-se na inexistência de tecnologias oriundas do Sul Global ou dos trópicos.

Diana Pizano, Endemic Foods / Biocultural Landscapes. Courtesy of Futura Trōpica.

Diana Pizano, Endemic Foods / Biocultural Landscapes. Courtesy of Futura Trōpica.

O projeto Futura Trōpica busca quebrar essa estrutura, sob a qual somos supostos receptores passivos do Norte Global. Ao mesmo tempo, a iniciativa procura reforçar e canalizar conversas sem hierarquias entre o continente africano, Abya Ayala, Industão, ou o Sul da Ásia e Polinésia, para reconhecer e desenvolver tecnologias que comumente tenham sido consideradas inferiores ou obsoletas. O Futura Trōpica busca propor concepções não binárias do planeta, que vão além das categorias de Ocidente/Oriente, Norte/Sul. E ao mesmo tempo, o projeto quer mostrar que, nesse cinturão tropical, compartilhamos certas diferenças que, no final das contas, nos tornam iguais.

DMP: Seria possível falar mais sobre o conceito de “mentalidade tropical”?

JPGS: Parto do princípio de que há certas peculiaridades na forma como as populações dos trópicos respondem aos pulsos de seus ambientes, a esses coquetéis de sol, diversidade e crise que fazem a realidade superar a ficção quase todos os dias. A ideia dos trópicos como mentalidade brinca com a etimologia da palavra “trópicos”: a palavra grega tropikos vem da crença de que o sol girava nos solstícios do Trópico do Câncer para o Trópico de Capricórnio, e novamente de volta.

Trópicos é o ponto de virada, o ponto de inflexão, que é também a crise, de tal forma que tropikos como mentalidade implica em transformar esses pulsos ambientais, ou seja, em rejeitar o impossível e usá-lo como meio. Exemplos dessas práticas são o “jeitinho” e a “gambiarra” brasileiros, o “jugaad” indiano, o ganês “goorgorlou”, ou o “rebusque” latino-americano, ou seja, formas criativas de improvisar para buscar soluções.

Juan Pablo Garcia Sossa, Repair and memories in Bogota and Bengaluru. Courtesy of Futura Trōpica.

Juan Pablo Garcia Sossa, Repair and memories in Bogota and Bengaluru. Courtesy of Futura Trōpica.

DMP: Como se pode entrar em contacto com o Futura Trōpica?

JPGS: A rede Futura Trōpica é semiprivada e só pode ser acessada através da conexão a redes wi-fi locais presentes em determinados pontos geográficos, como Bogotá, Kinshasa e Bengaluru. O principal interesse da Futura Trópica é fazer com que esse conhecimento flua dentro do cinturão tropical, sem hierarquias, evitando o olhar externo e mantendo uma certa opacidade que evite a exposição total aos sistemas exploratórios e extrativistas digitais em que vivemos (“capitalismo de vigilância”).

Periódica e temporariamente oferecemos “portas abertas”, dias em que habilitamos pontos de acesso público a partir de qualquer lugar do planeta. Com a finalidade de gerar canais alternativos de disseminação de informações, o conteúdo da Futura Trópica também circula em pendrives, em formato semelhante ao do “pacote semanal” de Cuba. Queremos entrar em contato com outras redes de pessoas distribuídas dentro do cinturão tropical. Então, sintam-se à vontade para entrar em contato, sabendo que podemos prover a instalação de um acesso.

Para ver mais sobre a rede: futura-tropica.network

Começado por
jpgs - Juan Pablo García Sossa

Suporte técnico Sarah Grant

Atuais colaboradores:

BOGOTÁ
Estación Terrena Bogotá
Valentina Medina
Álvaro Rodríguez Badel
Eblis Álvarez — Meridian Brothers
Diana Pizano — Comiendo Cuento
Sebastián Lema x Organizmo
Paulo Cesar Acosta
Eliana Muchachasoy — Benach Galería Sibundoy
Juan Covelli
Wilmer Rodríguez
EL PAISA

BENGALURU
Yatharth
Komal Jain
Deepikah Bhardwaj
Kevin Angelus & Vedant Sharma — Indian Ephemera / Design Minus Design
Ishita Shah — Curating for Culture
Aastha Gupta & Prateek Shankar — The Urdu Project
Debanshu Bhaumik
Karthika Sakthivel
Prabir Chitrakar

KINSHASA
Nada Tshibwabwa
Elsa Westreicher
Timbela Batimbela Yo (coletivo)
Maman Adeline Boyube
Judith Kaluaj
Maman Iza & Papa Lofo
Kill Bill
Lumumba Lab

…e muitos mais.

Daniela Medina Poch (Bogotá, Colômbia, 1992) é uma artista visual, escritora e pesquisadora interessada em explorar as complexas interrelações entre o Sul Global e o Norte Global. Vive em Berlim e faz parte da rede de mediadores de The New Patrons, além de cursar um mestrado em Arte em Contexto, na Universidade das Artes, em Berlim.

Tradução: Cláudio Andrade